CAMBRIDGE – Comentários sobre a economia mundial nunca deixaram de exortar para uma cooperação global maior. “O que acontece em qualquer lugar afeta a todos… [portanto] está bastante claro que o mundo precisa de mais… coordenação e cooperação internacional”, escreveu um importante funcionário do Fundo Monetário Internacional em 2013. “Praticamente todos os problemas que desestabilizam o mundo… são de natureza global e só podem ser confrontados com uma coalizão global”, disse um importante colunista em 2019.
As preocupações com as inadequações da governança global e o enfraquecimento do multilateralismo aumentaram nos últimos anos, porque os Estados Unidos e outras economias avançadas têm cada vez mais colocado suas agendas domésticas em primeiro lugar. As abordagens unilaterais têm dominado o comércio, as políticas industriais e a transição climática. A Organização Mundial do Comércio – a maior conquista da governança global na era da hiper globalização que estamos deixando para trás – foi reduzida a um ineficaz espectador.
Para o comentarista globalista, isso é claramente uma notícia má. Para a economia global, porém, as consequências são menos claras – e podem ser salutares. Na verdade, em um mundo em que os governos nacionais se concentram em sua própria prosperidade sustentável e coesão social, a economia global funcionaria bem. Após um exame mais minucioso, a defesa da governança econômica global revela-se consideravelmente mais fraca do que comumente se pressupõe.
Comecemos pelo caso convencional de cooperação global. Vivemos em um mundo economicamente interconectado, diz a usual argumentação. O que um país faz geralmente afeta os outros. Se os governos não coordenarem suas políticas e chegarem a um acordo sobre regras comuns, esses efeitos colaterais podem deixar todos em pior situação.
Mas esse argumento aparentemente razoável tem uma grande falha: a mera existência de transbordamentos não é uma justificativa adequada para a coordenação global. Na esmagadora maioria dos casos em que as políticas econômicas geram transbordamentos transfronteiriços, os governos nacionais retêm legitimamente total autonomia – com pouco prejuízo aparente para a economia mundial.
Consideremos um governo que deseja dobrar seu orçamento para a educação pública terciária ou para o treinamento de cientistas e engenheiros. Dever-se-ia permitir que outros governos se opusessem e invocassem regras internacionais para restringir ou disciplinar a política? Mesmo os globalistas mais obstinados considerariam isso uma possibilidade absurda.
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Mas definitivamente há um transbordamento transfronteiriço, e que poderia ser grande: se a política for implementada, o país de origem fortalecerá sua vantagem comparativa em bens intensivos em qualificação, prejudicando seus concorrentes nos mercados globais. Como os transbordamentos são tão difundidos e como muitos domínios da política governamental são naturalmente vistos como “domésticos” (como indica o exemplo da educação), eles não são um bom guia para onde deveríamos buscar a cooperação global.
Talvez as regras globais deveriam se concentrar em políticas que talvez prejudiquem a economia doméstica. Investir em educação pública provavelmente beneficiaria a economia doméstica, mesmo que prejudicasse certos parceiros comerciais. Mas aumentar as tarifas de importação ou subsidiar algumas indústrias prejudicaria, em muitas circunstâncias, a economia doméstica, bem como os parceiros comerciais.
Mas essa abordagem também não produziria um guia confiável. Tarifas de importação, subsídios e uma miríade de outras políticas que podem diminuir a eficiência em perfeitas condições de mercado podem ser desejáveis em condições em segundo lugar do mundo real – digamos, para lidar com o desemprego regional ou externalidades tecnológicas. Não está claro se as burocracias globais estariam melhor posicionadas – ou vistas como mais legítimas – do que as autoridades políticas nacionais para determinar a adequação de tais políticas para a economia doméstica. E, de qualquer forma, não se deveria permitir às democracias que cometessem seus próprios erros?
O argumento a favor da governança global é muito mais forte para a categoria bastante restrita de políticas que são estritamente para “empobrecer o vizinho” – o dano que elas geram no exterior é uma necessária pré-condição dos benefícios produzidos internamente. Explorar o poder de monopólio de um país nos mercados mundiais, manter baixos impostos sobre o capital para transferir lucros dos papéis v do exterior ou desvalorizar a moeda nacional para “roubar” empregos no exterior são casos clássicos.
Mas tais exemplos são poucos e distantes entre si. A grande maioria das políticas econômicas que produzem transbordamentos transfronteiriços adversos não são do tipo empobrecer o vizinho e seriam implementadas mesmo na ausência de danos a outros países.
E quanto ao “protecionismo climático”, que está no centro das preocupações contemporâneas em torno do unilateralismo? Embora os requisitos de conteúdo local dos subsídios verdes dos EUA e as tarifas da UE sobre importações intensivas de carbono tenham despertado a ira de outros países, essas preocupações são equivocadas. A mudança climática é um problema existencial para o mundo, e enfrentá-la é um verdadeiro bem público global. Do ponto de vista da governança global, seria muito pior se os países líderes escolhessem pegar carona nas políticas de descarbonização de outros e não fizessem muito para lidar com as mudanças climáticas.
Por uma série de razões amplamente domésticas, EUA e UE deram grandes passos para avançar na transição climática. Isso é motivo de comemoração, não de condenação, ainda que o tenham feito unilateralmente e com instrumentos muito diversos. O desejo de seus governos de manter alguns dos benefícios em casa, privilegiando a posição competitiva das empresas domésticas, é compreensível – e vale a pena pagar um pequeno preço pela economia mundial como um todo.
Muitos limites à autonomia política nacional também poderão produzir uma reação contra a economia global. Uma consequência da erosão da soberania nacional sob a hiper globalização foi o aumento da ansiedade econômica e a sensação de perda de controle entre muitos cidadãos. Essas são circunstâncias que exacerbam a xenofobia e a hostilidade de outros grupos. Como a concorrência das importações alimentou a perda de empregos em muitas comunidades, os eleitores se voltaram para os populistas autoritários e nacionalistas étnicos.
Dessa forma, sempre que os governos buscarem agendas econômicas, sociais e ambientais mais inclusivas, estarão fornecendo um benefício adicional para a economia mundial. Economias bem governadas, onde a prosperidade é amplamente compartilhada, estão mais propensas a acolher a expansão do comércio internacional, investimento e imigração. Como ensina a economia, é a economia doméstica que colhe a maior parte dos benefícios da abertura à economia mundial, desde que os benefícios sejam distribuídos equitativamente. Ajudando a si mesmos, os países ajudam a economia global.
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Antara Haldar
advocates a radical rethink of development, explains what went right at the recent AI Safety Summit, highlights the economics discipline’s shortcomings, and more.
The prevailing narrative that frames Israel as a colonial power suppressing Palestinians’ struggle for statehood grossly oversimplifies a complicated conflict and inadvertently vindicates the region’s most oppressive regimes. Achieving a durable, lasting peace requires moving beyond such facile analogies.
rejects the facile moralism of those who view the ongoing war through the narrow lens of decolonization.
The far-right populist Geert Wilders’ election victory in the Netherlands reflects the same sentiment that powered Brexit and Donald Trump’s candidacy in 2016. But such outcomes could not happen without the cynicism displayed over the past few decades by traditional conservative parties.
shows what Geert Wilders has in common with other ultra-nationalist politicians, past and present.
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CAMBRIDGE – Comentários sobre a economia mundial nunca deixaram de exortar para uma cooperação global maior. “O que acontece em qualquer lugar afeta a todos… [portanto] está bastante claro que o mundo precisa de mais… coordenação e cooperação internacional”, escreveu um importante funcionário do Fundo Monetário Internacional em 2013. “Praticamente todos os problemas que desestabilizam o mundo… são de natureza global e só podem ser confrontados com uma coalizão global”, disse um importante colunista em 2019.
As preocupações com as inadequações da governança global e o enfraquecimento do multilateralismo aumentaram nos últimos anos, porque os Estados Unidos e outras economias avançadas têm cada vez mais colocado suas agendas domésticas em primeiro lugar. As abordagens unilaterais têm dominado o comércio, as políticas industriais e a transição climática. A Organização Mundial do Comércio – a maior conquista da governança global na era da hiper globalização que estamos deixando para trás – foi reduzida a um ineficaz espectador.
Para o comentarista globalista, isso é claramente uma notícia má. Para a economia global, porém, as consequências são menos claras – e podem ser salutares. Na verdade, em um mundo em que os governos nacionais se concentram em sua própria prosperidade sustentável e coesão social, a economia global funcionaria bem. Após um exame mais minucioso, a defesa da governança econômica global revela-se consideravelmente mais fraca do que comumente se pressupõe.
Comecemos pelo caso convencional de cooperação global. Vivemos em um mundo economicamente interconectado, diz a usual argumentação. O que um país faz geralmente afeta os outros. Se os governos não coordenarem suas políticas e chegarem a um acordo sobre regras comuns, esses efeitos colaterais podem deixar todos em pior situação.
Mas esse argumento aparentemente razoável tem uma grande falha: a mera existência de transbordamentos não é uma justificativa adequada para a coordenação global. Na esmagadora maioria dos casos em que as políticas econômicas geram transbordamentos transfronteiriços, os governos nacionais retêm legitimamente total autonomia – com pouco prejuízo aparente para a economia mundial.
Consideremos um governo que deseja dobrar seu orçamento para a educação pública terciária ou para o treinamento de cientistas e engenheiros. Dever-se-ia permitir que outros governos se opusessem e invocassem regras internacionais para restringir ou disciplinar a política? Mesmo os globalistas mais obstinados considerariam isso uma possibilidade absurda.
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Mas definitivamente há um transbordamento transfronteiriço, e que poderia ser grande: se a política for implementada, o país de origem fortalecerá sua vantagem comparativa em bens intensivos em qualificação, prejudicando seus concorrentes nos mercados globais. Como os transbordamentos são tão difundidos e como muitos domínios da política governamental são naturalmente vistos como “domésticos” (como indica o exemplo da educação), eles não são um bom guia para onde deveríamos buscar a cooperação global.
Talvez as regras globais deveriam se concentrar em políticas que talvez prejudiquem a economia doméstica. Investir em educação pública provavelmente beneficiaria a economia doméstica, mesmo que prejudicasse certos parceiros comerciais. Mas aumentar as tarifas de importação ou subsidiar algumas indústrias prejudicaria, em muitas circunstâncias, a economia doméstica, bem como os parceiros comerciais.
Mas essa abordagem também não produziria um guia confiável. Tarifas de importação, subsídios e uma miríade de outras políticas que podem diminuir a eficiência em perfeitas condições de mercado podem ser desejáveis em condições em segundo lugar do mundo real – digamos, para lidar com o desemprego regional ou externalidades tecnológicas. Não está claro se as burocracias globais estariam melhor posicionadas – ou vistas como mais legítimas – do que as autoridades políticas nacionais para determinar a adequação de tais políticas para a economia doméstica. E, de qualquer forma, não se deveria permitir às democracias que cometessem seus próprios erros?
O argumento a favor da governança global é muito mais forte para a categoria bastante restrita de políticas que são estritamente para “empobrecer o vizinho” – o dano que elas geram no exterior é uma necessária pré-condição dos benefícios produzidos internamente. Explorar o poder de monopólio de um país nos mercados mundiais, manter baixos impostos sobre o capital para transferir lucros dos papéis v do exterior ou desvalorizar a moeda nacional para “roubar” empregos no exterior são casos clássicos.
Mas tais exemplos são poucos e distantes entre si. A grande maioria das políticas econômicas que produzem transbordamentos transfronteiriços adversos não são do tipo empobrecer o vizinho e seriam implementadas mesmo na ausência de danos a outros países.
E quanto ao “protecionismo climático”, que está no centro das preocupações contemporâneas em torno do unilateralismo? Embora os requisitos de conteúdo local dos subsídios verdes dos EUA e as tarifas da UE sobre importações intensivas de carbono tenham despertado a ira de outros países, essas preocupações são equivocadas. A mudança climática é um problema existencial para o mundo, e enfrentá-la é um verdadeiro bem público global. Do ponto de vista da governança global, seria muito pior se os países líderes escolhessem pegar carona nas políticas de descarbonização de outros e não fizessem muito para lidar com as mudanças climáticas.
Por uma série de razões amplamente domésticas, EUA e UE deram grandes passos para avançar na transição climática. Isso é motivo de comemoração, não de condenação, ainda que o tenham feito unilateralmente e com instrumentos muito diversos. O desejo de seus governos de manter alguns dos benefícios em casa, privilegiando a posição competitiva das empresas domésticas, é compreensível – e vale a pena pagar um pequeno preço pela economia mundial como um todo.
Muitos limites à autonomia política nacional também poderão produzir uma reação contra a economia global. Uma consequência da erosão da soberania nacional sob a hiper globalização foi o aumento da ansiedade econômica e a sensação de perda de controle entre muitos cidadãos. Essas são circunstâncias que exacerbam a xenofobia e a hostilidade de outros grupos. Como a concorrência das importações alimentou a perda de empregos em muitas comunidades, os eleitores se voltaram para os populistas autoritários e nacionalistas étnicos.
Dessa forma, sempre que os governos buscarem agendas econômicas, sociais e ambientais mais inclusivas, estarão fornecendo um benefício adicional para a economia mundial. Economias bem governadas, onde a prosperidade é amplamente compartilhada, estão mais propensas a acolher a expansão do comércio internacional, investimento e imigração. Como ensina a economia, é a economia doméstica que colhe a maior parte dos benefícios da abertura à economia mundial, desde que os benefícios sejam distribuídos equitativamente. Ajudando a si mesmos, os países ajudam a economia global.
Tradução de Anna Maria Dalle Luche, Brazil