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Re-Orientando a América

NOVA IORQUE – Há cerca de 40 anos, quando entrei na Universidade de Oxford como estudante de licenciatura, declarei o meu interesse no Médio Oriente. Foi-me dito que esta parte do mundo vinha sob a rubrica de “Estudos Orientais,” e que eu seria atribuído a um professor apropriado. Mas quando cheguei para o meu primeiro encontro no gabinete do professor, as estantes estavam repletas de volumes ostentando caracteres Chineses. Era um especialista no que era, pelo menos para mim na altura, o Oriente errado.

Algo parecido a este engano sucedeu à política externa Americana. Os Estados Unidos têm-se preocupado com o Médio Oriente – de certo modo, o Oriente errado – e não têm prestado atenção adequada à Ásia Oriental e ao Pacífico, onde será escrita muita da história do século vinte e um.

A boa notícia é que este foco se está a desviar. Na verdade, está a ocorrer uma transformação serena na política externa Americana, que é tão significativa como devida. Os EUA redescobriram a Ásia.

 “Redescobriram” é o termo operativo neste caso. A Ásia foi um dos dois cenários principais da II Grande Guerra, e voltou a partilhar a centralidade com a Europa durante a Guerra Fria. Na verdade, os dois maiores conflitos desse período – as guerras da Coreia e do Vietname – ocorreram no continente Asiático.

Mas, com o fim da Guerra Fria e o desmoronamento da União Soviética, a Ásia retirou-se do interesse Americano. Na primeira década do pós-Guerra Fria, os EUA focaram muita da sua atenção na Europa. Os decisores políticos Americanos focaram-se primariamente em alargar a OTAN para englobar muitas das antigas nações do Pacto de Varsóvia, e em debater-se com as guerras pós-Jugoslavas.

A segunda fase do pós-Guerra Fria começou com os ataques terroristas de 11 de Setembro. O que se seguiu foi uma década de focalização dos EUA no terrorismo e o comissionamento em larga escala de forças militares Americanas para o Iraque e Afeganistão. Os dois conflitos exigiram mais de 6.000 vidas Americanas, custaram mais de 1 bilião de dólares, e consumiram horas incontáveis a dois presidentes e às suas equipas principais.

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Mas agora esta fase da política externa Americana está a terminar. O Presidente Barack Obama anunciou que as forças armadas dos EUA abandonarão o Iraque no fim de 2011. No Afeganistão, os níveis de efectivos dos EUA atingiram o ponto máximo e estão a decrescer; as únicas questões referem-se ao ritmo da retirada e ao tamanho e papel de qualquer presença militar residual dos EUA após 2014.

Isto não significa que o Médio Oriente seja irrelevante ou que os EUA o devam ignorar. Pelo contrário, ainda abriga importantes reservas de petróleo e de gás. É uma parte do mundo onde os terroristas estão activos e onde os conflitos têm sido comuns. O Irão está cada vez mais perto de desenvolver armas nucleares; se o fizer, outros poderão bem segui-lo. E é uma região agora experienciando o que poderão ser provadas como revoltas políticas internas históricas. Existe também o laço Americano ímpar com Israel.

De qualquer modo, há argumentos para que os EUA façam menos no grande Médio Oriente do que têm feito em anos recentes: o enfraquecimento da al-Qaeda; as poucas perspectivas para os esforços de mediação; e, acima de tudo, a evidência crescente de que, por qualquer medida, as grandes iniciativas de construção de nações não estão a produzir rendimentos compagináveis com os investimentos.

Ao mesmo tempo, há argumentos fortes para um maior envolvimento dos EUA na região Ásia-Pacífico. Com a sua grande população e as suas economias de rápido crescimento, é difícil exagerar a importância económica da região. As empresas Americanas exportam anualmente para os países da região mais de 300 mil milhões de dólares em bens e serviços. Ao mesmo tempo, as nações Asiáticas são uma fonte importante de investimento para a economia dos EUA.

A manutenção da estabilidade regional é assim crítica para o sucesso económico dos EUA (e do globo). Os EUA têm obrigações por múltiplas alianças – com o Japão, Coreia do Sul, Austrália, Filipinas e Tailândia – que são necessárias, em parte, para impedir uma agressão Norte-Coreana. Além do mais, a política Americana deve criar um ambiente em que uma China em ascensão nunca seja tentada a usar coercivamente o seu poderio crescente – dentro ou fora da região. Por esta razão, os esforços recentes dos EUA para reafirmar os laços com a Índia e vários países do Sudeste Asiático fazem perfeito sentido.

Os EUA fazem bem em mudar a sua atenção do Médio Oriente para o Extremo Oriente. A boa notícia é que esta conclusão parece ser partilhada por todo o espectro político dos EUA. Mitt Romney, o provável nomeado Republicano à presidência, compromete-se em aumentar a taxa de construção naval – um compromisso associado a uma maior presença dos EUA no Pacífico. E a Secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton refere-se ao afastamento da América relativamente ao Médio Oriente: “O centro de gravidade estratégico e económico do mundo está a deslocar-se para leste, e estamos a focar-nos mais na região Ásia-Pacífico.”

Independentemente de o século vinte e um vir a ser um outro “século Americano”, é certo que será um século Asiático e Pacífico. É simultaneamente natural e sensato que os EUA estejam no centro do que vier a evoluir desse facto.

https://prosyn.org/Zcb5Noppt