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Para além de Fukushima

VIENA – A energia nuclear tornou-se mais segura desde o acidente devastador que ocorreu em Fukushima, no japão, há um ano atrás. Irá tornar-se ainda mais segura nos anos vindouros, desde que governos, operadores de centrais nucleares e entidades reguladoras não baixem a guarda.

O acidente em Fukushima foi consequência de um tremor de terra e de um tsunami de uma gravidade sem precedentes. Mas, como as autoridades japonesas já admitiram, as falhas humanas e organizacionais também tiveram um papel importante.

Por exemplo, a autoridade reguladora de energia nuclear japonesa não foi suficientemente independente e a supervisão da operadora das instalações, a TEPCO, foi fraca. Nas instalações de Fukushima, o fornecimento de energia de emergência, essencial para assegurar as operações vitais de segurança tais como o arrefecimento dos reactores e o arrefecimento das varas de combustível utilizadas, não se encontrava devidamente protegido. A formação para responder a situações de acidentes graves era inadequada. Houve uma falta de resposta integrada de emergência nas instalações e a nível nacional.

As falhas humanas e organizacionais não são exclusivas do Japão. Fukushima foi um alerta para todos os países que utilizam a energia nuclear. Provocou uma introspecção séria e um reconhecimento de que a segurança não pode ser um dado adquirido em lugar nenhum. As causas principais do acidente já foram apuradas.

De facto, os governos, as entidades reguladoras e os operadores de centrais nucleares pelo mundo fora começaram a aprender as lições certas. Um robusto plano de acção internacional de segurança nuclear está a ser implementado. Como resultado, reduziu-se a probabilidade de ocorrer outro desastre à escala do que sucedeu em Fukushima.

O que mudou exactamente? Talvez o mais importante tenha sido o facto de se ter alterado radicalmente o pior dos cenários utilizado como pressuposto para o planeamento de segurança. Em Fukushima, os reactores suportaram um tremor de terra de magnitude 9,0 - muito para além do que tinham sido projectados para suportar. Mas as instalações não tinham sido concebidas para suportar as ondas tsunami de 14 metros de altura que, em menos de uma hora mais tarde, varreram o muro de protecção marítima.

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Na sequência de Fukushima, as defesas contra múltiplos desastres naturais graves, incluindo tremores de terra e tsunamis, estão a ser reforçadas em instalações nucleares mundialmente a nível mundial. Estão a ser tomadas medidas de forma a melhorar o grau de preparação no caso de cortes de energia prolongados, proteger fontes de energia de emergência e assegurar a existência de água para arrefecimento, mesmo em condições de acidentes graves.

As normas globais de segurança nuclear estão a ser revistas. A capacidade de resposta de emergência está a ser actualizada. Os operadores de centrais e as entidades reguladoras nacionais estão a ser analisados de forma mais minuciosa. Os países estão a permitir o acesso às suas centrais para aumentar o número e a exigência de avaliações internacionais de segurança.

Apesar do acidente, a utilização global de energia nuclear parece estar pronta a crescer de forma estável dentro dos próximos 20 anos, embora a um ritmo inferior ao anteriormente previsto. As razões deste facto não se alteraram: a procura crescente de energia, em paralelo com as preocupações sobre as alterações climáticas, os preços voláteis dos combustíveis fósseis e a segurança do fornecimento energético. Será difícil para o mundo atingir a meta dupla de assegurar um fornecimento de energia sustentável e travar os gases com efeito de estufa, se não considerar a energia nuclear como uma parte importante do leque energético mundial.

A Agência Internacional de Energia Atómica prevê, até ao ano de 2030, um acréscimo de 90 novos reactores nucleares a adicionar aos 437 já em operação. Embora alguns países tenham abandonado ou restringido os seus planos de energia nuclear após Fukushima, os maiores utilizadores de energia nuclear, tais como a China, a India e a Rússia estão a avançar com planos de expansão ambiciosos. Muitos outros países, principalmente aqueles que estão em desenvolvimento, consideram abrir as portas à energia nuclear.

A segurança nuclear é da maior importância para os utilizadores estabelecidos e para os recém-chegados. É importante para os países que já decidiram acabar com a sua utilização porque os seus reactores irão continuar em operação durante muitos anos e será necessário o seu encerramento, com os respectivos resíduos nucleares armazenados de forma segura. E é importante para os países que estão contra a energia nuclear, pois muitos deles têm países vizinhos com centrais nucleares.

Os países que têm em vista novos programas de energia nuclear deverão reconhecer que atingir o seu objectivo é um empreendimento desafiante a longo prazo. Precisam de investir uma quantidade considerável de tempo e dinheiro na formação de cientistas e engenheiros, criando reguladores verdadeiramente independentes e bem fundados e estabelecendo a infraestrutura técnica necessária. Alguns países ainda ficam aquém neste campo.

Contudo, contrariamente à percepção comum, a energia nuclear tem um registo geral de segurança positivo. Os novos reactores actualmente em construção incorporam características significativamente melhoradas, quer a nível activo quer passivo, comparativamente à geração de reactores de Fukushima. Mas, para reconquistar e manter a confiança das pessoas, os governos, reguladores e operadores têm que ser transparentes no que diz respeito aos benefícios e riscos da energia nuclear - e honestos quando as coisas correm mal.

O facto de um acontecimento igual ao de Fukushima ter ocorrido no Japão, um dos países industrialmente mais avançados do mundo, serve para nos recordar que, no que respeita a energia nuclear, nada pode ser considerado como um dado adquirido. A complacência pode ser fatal. As melhorias de segurança verificadas nos últimos 12 meses devem ser consideradas apenas como um começo. Não devemos voltar a abordar o tema de forma rotineira, consoante Fukushima se vai desvanecendo da memória.

https://prosyn.org/xMnSbLypt