A Nova Economia do Clima

NOVA IORQUE – Esta sexta-feira, na sua última avaliação detalhada das provas do aquecimento global, o Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre a Mudança Climática mostrará que os cientistas mundiais do clima estão mais certos que nunca que a actividade humana – principalmente a queima de combustíveis fósseis – está a causar o aumento das temperaturas e dos níveis do mar.

Em anos recentes, uma série de catástrofes climáticas extremas – incluindo o Furacão Sandy em Nova Iorque e Nova Jérsia, cheias na China, e secas no Meio-Oeste Americano, na Rússia e em muitos países em desenvolvimento – causou danos enormes. Na semana passada, o México foi alvo de furacões simultaneamente no Pacífico e no Golfo do México que devastaram vilas e cidades no seu caminho. A mudança climática é um impulsionador importante destas catástrofes, e arriscamo-nos a muito pior.

Isto coloca um novo debate no centro das atenções: como reconciliar o reforço do combate à redução de emissões de gases com efeitos de estufa com um crescimento económico forte.

Este é um debate que já se encontra atolado em controvérsia. À medida que a maior parte dos países começou a investir seriamente em energia renovável, e muitos estão a implementar preços e regulamentos de carbono, os críticos reclamam que tais políticas poderão minar o crescimento. Com a economia global ainda em recuperação da crise financeira de 2008, os custos mais elevados da energia – ainda não completamente compensados por uma maior eficiência energética – preocupam os líderes empresariais e políticos.

O advento do gás de xisto veio confundir ainda mais o debate energético. Se o gás substituir o carvão, poderá ser uma ponte útil para um futuro de carbono reduzido. Mas espantosamente, é o carvão, o combustível mais sujo, que está a sofrer o aumento mais rápido na utilização. As empresas e os investidores estão a cobrir as suas apostas tomando algumas medidas de eficiência de utilização de recursos e investindo em alguns activos de baixo carbono, mas deixando as suas carteiras e actividades de alto teor de carbono na sua maior parte intactas. A indecisão política em alguns países não ajudou.

Os defensores de uma acção mais forte respondem que os investimentos de baixo carbono podem gerar crescimento mais forte e mais limpo. Apontam para as poupanças disponibilizadas pela eficiência energética, e para as oportunidades de mercado geradas pelas tecnologias de energia limpa, à medida que os processos de aprendizagem e descoberta dão frutos. Tentam demonstrar os benefícios que um padrão mais sustentável de desenvolvimento pode trazer às cidades do mundo, à saúde do mundo (a partir da redução da poluição atmosférica), à segurança energética, e à capacidade de acesso à energia por parte dos mais pobres do mundo. E propõem títulos de investimento verdes e bancos de investimento público para financiar novas infra-estruturas e empregos numa altura em que as taxas de juro mundiais estão baixas e a procura está fraca em muitos países.

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Estes são debates económicos sérios, mas com demasiada frequência têm ficado emaranhados em disputas ideológicas sobre a resposta apropriada à crise económica e o valor da intervenção do governo nos mercados. Isso é lamentável. As mudanças climáticas não são uma questão partidária, e a política climática é essencialmente baseada no mercado. Trata-se de corrigir ineficiências de mercado para que os mercados e o empreendedorismo possam desempenhar o seu papel adequado de garantir a inovação e a distribuição eficiente de recursos.

De modo a escapar a este impasse, ajudámos a lançar a Comissão Global sobre Economia e Clima. O projecto Nova Economia do Clima, da Comissão, reúne sete destacados institutos de pesquisa política de seis continentes, supervisionados por um painel de antigos chefes de governo e ministros das finanças e de líderes empresariais proeminentes, e aconselhados por um painel de destacados economistas de todo o mundo. O seu objectivo é fornecer novas provas cabais relativas ao modo como os governos e as empresas poderão alcançar um crescimento económico mais forte, enquanto enfrentam simultaneamente os riscos climáticos.

Poucos governos ou investidores partem do ponto de vista da mudança climática. Pretendem promover o investimento e o crescimento económico, criar empregos, estabilizar as finanças públicas, expandir mercados, colher lucros, garantir fornecimentos fiáveis de energia e alimentos, produzir bens e serviços, reduzir a pobreza, e construir cidades. Portanto a questão principal que precisamos de colocar não é se podemos reduzir emissões, mas de que modo a política pública pode ajudar a alcançar estes objectivos fundamentais ao mesmo tempo que reduz emissões e constrói uma economia mais resistente ao clima.

Há hoje muitas experiências em todo o mundo nesta área. Quando o Relatório Stern sobre a economia da mudança climática foi publicado há sete anos, a questão era principalmente teórica. Agora países em todos os estádios de desenvolvimento perseguem novos padrões de crescimento económico que levam o clima em consideração.

A Alemanha, por exemplo, está a planear a transição mais ambiciosa do mundo para a energia de baixo carbono, baseada na conservação energética e nas energias renováveis. A Coreia do Sul transformou o “crescimento verde” num objectivo económico central. A Lei Geral sobre Mudança Climática de 2012 no México colocou-o na rota para um importante aumento de energia limpa. A China colocou o desenvolvimento industrial de tecnologias verdes no topo da sua agenda. A Etiópia procura mover-se para a agricultura de baixo carbono. O Brasil reduziu significativamente a taxa de desflorestação da Amazónia.

Algumas grandes empresas estão a fornecer exemplos marcantes do que é possível. A Unilever comprometeu-se com o aprovisionamento sustentável de produtos agrícolas e florestas. A Coca-Cola está a eliminar progressivamente toda a utilização de hidrofluorocarbonetos poluentes do clima. O gigante do retalho Wal-Mart está a aplicar a redução de emissões a toda a sua cadeia de fornecimento. Entretanto, o Banco Mundial e o Banco Europeu de Investimento deixaram de financiar centrais a carvão com emissões elevadas.

Porém, permanecem questões genuínas sobre quão depressa se devem mover as economias num caminho de baixo carbono, e qual o modo mais eficaz para fazê-lo. Algumas políticas de baixo carbono foram claramente caras, enquanto outras opções, aparentemente mais eficazes do ponto de vista do custo, nem sequer foram adoptadas. Qualquer transformação estrutural envolve custos, cedências, e incertezas, e é vital que entendamos isto devidamente.

Interesses poderosos opor-se-ão, sem dúvida, a qualquer transição para o baixo carbono, rejeitando e frequentemente abafando aqueles que com ela poderão beneficiar. Isso torna a clarificação das escolhas ainda mais importante. À medida que a ciência clarifica quão importante é a questão climática, os economistas e legisladores devem agora explicar como pode ser respondida.

Traduzido do inglês por António Chagas

https://prosyn.org/VycWHqbpt