johnson154_Danish DefenceAnadolu Agency via Getty Images)_nordstreamattack Danish Defence/Anadolu Agency via Getty Images

Putin incita, Europa hesita

WASHINGTON (D.C.) – A anexação ilegal por Vladimir Putin de quatro regiões da Ucrânia, que ele agora diz que são consideradas parte da Rússia, representa uma grande escalada na guerra iniciada por ele em fevereiro. Os paralelos com a estratégia de expansão de Hitler ganham mais força a cada dia que passa. Ante o avanço das forças ucranianas, o presidente russo ordena que suas tropas disparem mísseis e artilharia de indiscriminadamente em populações civis. Sempre que suas tropas recuam, novos indícios de crimes de guerra e assassinatos em massa são descobertos.

No entanto, em algumas regiões da Europa, permanece o desejo de dar a Putin ao menos parte do que ele deseja, na hipótese de que ele então pararia e que as relações econômicas poderiam voltar a ter alguma semelhança com o que foram no passado. Ao menos em conversas privadas, os principais industriais alemães defendem um apaziguamento nos moldes do de Munique. Contudo, a conciliação de Neville Chamberlain não parou Hitler, e abordagem semelhante não vai parar Putin, que tem projetos para os Países Bálticos, a Polônia e provavelmente outros lugares.

Felizmente, há um jeito melhor: um grande impulso da União Europeia na direção da conservação de energia e de renováveis, aliado a um estreito teto de preços sobre as exportações de petróleo e carvão russas, além da disposição de diminuir esse teto cada vez que Putin aumentar o tom.

As agressões russas vêm expondo completamente a maior vulnerabilidade da Europa: Ao longo das últimas três décadas, lideranças da Europa Ocidental – em particular na Alemanha – acolheram a ideia de que a Rússia era e seria sempre um fornecedor confiável de energia barata. Setores inteiros foram criados com base nessa premissa, assim como algumas fortunas pessoais.

Hoje sabemos que isso era uma armadilha. A invasão da Ucrânia por Putin custa cerca de €1 bilhão (US$ 980 milhões) por dia para ser administrada, o que dá praticamente o que a Rússia recebe da venda de combustíveis fósseis para a Europa. Como cidadãos individuais, os europeus estão abrindo seus corações e lares para refugiados da Ucrânia. Como consumidores e produtores, porém, eles continuam a mandar a Putin a moeda corrente de que precisa para manter esses refugiados longe de seus lares e arrebentar drones suicidas iranianos nas salas de estar daqueles que continuam na Ucrânia.

A moeda corrente é necessária para comprar suprimentos militares e relacionados da China (inclusive mísseis), além de uma série de armamentos da Coreia do Norte. Euros também são necessários para impedir que o rublo desmorone. As centenas de milhares de militares que hoje fogem da Rússia sem dúvida estão levando junto tudo o que pouparam na vida – convertendo o valor de rublos em algum tipo de câmbio estrangeiro. Com suas reservas cambiais congeladas, o banco central da Rússia precisa do fluxo diário de euros das vendas de energia à Europa.

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E agora, há a suspeita de que os russos atacaram descaradamente encanamentos do gasoduto Nord Stream. O objetivo não era interromper os fluxos de gás – eles não precisam de sabotagem para conseguir isso, e os encanamentos não transportavam muito gás para vender. Em vez disso, Putin está testando os limites de com o que seu regime consegue se safar.

E se uma refinaria de petróleo pegar fogo? E se acontecer um “acidente” em uma usina nuclear? Putin quer saber como lideranças europeias vão responder – calculando que o mais provável é que não façam nada por medo dum conflito militar mais direto com a Rússia. Uma vez que Putin encontre os pontos de pressão corretos, ele aumentará ainda mais a pressão – com o objetivo de acabar com o fornecimento de armas e auxílio financeiro à Ucrânia.

A resposa certa da Europa nessa situação seria tríplice. Primeiro, a UE devia adotar uma estratégia pan-europeia que implemente já todas as medidas de eficiência energética possíveis, ao lado de um programa combinado de investimentos em renováveis. Seria simples para a UE convencer mercados de dívidas de que é preciso haver uma mudança grande nas fontes de energia ao longo dos próximos 5-10 anos, e que os benefícios se estenderiam para muito além da Europa. Os europeus também precisam pensar nos empregos que seriam criados, e na tecnologia que poderia ser melhorada por algumas das pessoas mais inovadoras do mundo, se o nível e tipo apropriado de recursos fossem envolvidos de forma integrada.

A segunda ponta é adotar de modo apropriado e implementar totalmente o teto de preços de petróleo proposto pelo G7 – e estender o mesmo princípio ao carvão. Em ambos os casos, os navios e serviços financeiros da UE são essenciais às exportações russas. Sob o regime proposto, essas exportações podem continuar a usar serviços ocidentais, mas apenas se o preço pago à Rússia for menor do que o preço mundial.

A última ponta diz respeito a quão “mais baixo do que o preço mundial” o teto deveria ser. Cada vez que Putin intensificar a violência, o teto deve ser diminuído. Por exemplo, se anteriormente o G7 vinha cogitando um teto de US$ 50, os ataques ao Nord Stream deveriam baixar esse teto para US$ 45, e a “anexação” quádrupla deveria tê-lo rebaixado ainda mais, talvez para US$ 35. Levando-se em conta que o custo marginal de produção do petróleo russo é de menos de US$ 10, o Kremlin ainda teria incentivo para exportar.

Se Putin se retirar da Ucrânia e parar de matar pessoas, o teto poderia subir de novo. Contudo, quanto fluxo de caixa livre a Europa deveria de fato querer que Putin – ou qualquer outro regime russo – obtenha no futuro previsível?

Tradução por Fabrício Calado Moreira

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